sexta-feira, 14 de maio de 2010
São José, o Cine
Carlos Azevedo // jornalista e professor universitário
Em época de inverno, na sua marquise ainda se improvisa um abrigo, mesmo que provisório. A sua calçada desgastada e irregular ainda pode ser usada como palco para as pessoas que esperam demoradamente os ônibus. As paredes infiltradas também servem para colar cartazes de apresentações musicais de qualidade e gosto duvidosos. Falo do que restou, falo de escombros, de urbes e ruínas, do que resta dos mortos, como bem disse o poeta Políbio Alves em seus livros. Falo do que resta do Cine São José. Das ruínas da memória social da cultura campinense, de um tempo que se foi. Mas também dialogo com os homens e mulheres de hoje, com que restou e também com o que pode ser feito. E sonhado...
Talvez esteja errado e tudo não volte mais, "Cinema Paradiso". Leio na monumental obra sobre a sétima arte na Paraíba, escrita por Wills Leal, que o Cine São José foi criado em novembro de 1945. E que ele tinha uma esquisita promoção para as pessoas do bairro: quem trazia a sua própria cadeira de casa tinha desconto no ingresso. Wills também relata que Campina Grande possuiu muitos cinemas de bairro e que eles tiveram um grande papel no entretenimento e formação de muita gente na cidade.
Escutei alguns rumores de que querem transformar o antigo cinema do São José em mais um "shopping" de camelôs. Seria enterrar mais um capítulo de nossa história cultural no lixo. Mas também tenho visto professores e alunos das duas principais universidades sonhando alto, querendo um rumo mais decente para o prédio.
Não é que o governo tenha má vontade com o São José, o Cine. Dizem que ele foi reformado umas quatro vezes, em gestões de diferentes cores políticas. Na última, alguns anos atrás, resgatou-se a beleza do prédio. O São José brilhava sem ao menos ter um filme em cartaz. Vazio de pessoas e de projetos, sem uso, o prédio foi envelhecendo, degradando, se arruinando. Não lhe foi dada uma utilidade. E os espaços mais conservados são aqueles nos quais se tem um uso social.
É hora de sonhar com mais uma reforma, dessa vez diferente. E que o espaço seja cedido a um centro cultural para abrigar a criatividade de jovens estudantes, cineastas, atores e teatrólogos. O roteiro do filme é este... só falta rodar!
Carlos Azevedo
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