terça-feira, 30 de setembro de 2008

É Bairrismo?

Indiscutivelmente existe alguma “força estranha” que provoca algo, mais estranho ainda, uma ligação muito forte das pessoas com o lugar onde nasceram, onde viveram seus anos de juventude, onde aprenderam os valores da vida e adquiriram suas primeiras impressões do mundo.

Alguns elementos visuais, sonoros, alguns sabores e cheiros, algumas lembranças guardadas apenas na memória, podem fazer esse link e nos conectar imediatamente com essa força estranha. Assim são os símbolos, as bandeiras, os brasões, os hinos...

Na nossa cidade, vivemos um tempo singular, onde a população que tem essa ligação com ela, está escasseando. O fenômeno “Sulanca” trouxe muito dinheiro e “desenvolvimento” para nossa terra e com eles também muita gente de outras terras. Hoje, a nossa população é formada na sua grande maioria por “forasteiros”, no melhor sentido da palavra, pessoas que “não são daqui, nem vieram pra ficar”, que não sentem, no fundo de si, essa emoção que sentimos quando alguém fala bem de nossa terra. Que, da mesma forma, não se sentem mal quando alguém tece comentários maldosos. Não têm nossa identidade, não têm compromisso emocional com nossa terra.

No hino de Santa Cruz, temos uma estrofe que fala da paisagem da cidade de uma forma tão bonita! Uma paisagem que deslumbrava, “...Com variado matiz...”, nossa cidade era “...do Capibaribe, a atalaia e esposa feliz...” mas o poder econômico, o poder de destruição das Riquezas em troca de “riquezas” em nome do desenvolvimento, sem sustentabilidade, sem respeito à natureza, à história e ao patrimônio coletivo acabou com nosso hino! essa “nova Santa Cruz” próspera e devastada esqueceu-se dos seus verdadeiros valores.

Os santacruzenses, santacruzenses mesmo, que aqui nasceram, em sua grande maioria se apóiam na desculpa de que, hoje estão “ricos” e que a cidade é boa assim como está. Às vezes nem fazem isso conscientemente, mas seus atos os denunciam. E esse comportamento é o que alimenta a cultura do medo, da defesa do patrimônio com “unhas e dentes”, da VIOLÊNCIA! As pessoas estão perdendo o sentimento de solidariedade, de amor, de vida em sociedade, de COLETIVO! “Se está bom pra mim, o resto que se exploda!”

Isso se reflete no dia-a-dia, na qualidade de vida da cidade, na poluição sonora (o som do meu carro é melhor do que o dos outros), na poluição visual (a placa da minha loja é maior do que a dos outros), na desorganização do trânsito (não quero nem saber, é proibido, mas eu dou uma propina para o guarda), na sujeira das ruas (ah! Joga aí mesmo, tem quem limpe), isso são só alguns exemplos que já passam despercebidos para a população, as pessoas já se acostumaram com os montinhos de entulho de construção nas praças, nas calçadascisternas, com as moscas, a poeira, o calor, as muriçocas, o fedor, os buracos, as ruas interditadas, o lixo...

Será que alguém já parou pra pensar porque está aqui? Para que veio ao mundo? O que significa a vida?

Será que é tanta vantagem assim, tirar vantagem de tudo, amealhar até o último vintém, estar sempre no carro mais novo, na casa maior e viver no caos? E continuar não dando olhos para a empáfia e falta de educação dos seus filhos, ao lixo que o redemoinho trouxe para a sua varanda, às ruas enlameadas no inverno e à poeira no verão, causando asma em tudo quanto é criança, à falta de um bom atendimento em quase todos os estabelecimentos da cidade, etc, etc, etc?

Quando será que vamos acordar, pelo menos para o nosso “progresso”, para a indústria e o comércio, para a nossa economia, trazendo qualidade para os nossos produtos, atenção ao consumidor (o código de defesa do consumidor na cidade não existe!), o atendimento, a qualificação dos funcionários, à imagem da cidade lá fora?

Fico muito triste quando escuto – e não é com pouca freqüência – que minha terra é a terra do desmando, a terra dos ladrões, se for pra feira vai ser assaltado, é muito perigoso, é sujo, não tem comida que preste, só tem gente mal educada, é muito barulhento, não tem informação, é roupa de má qualidade, etc, etc, etc...

Quando será que vamos acordar para a vida? Estamos aqui para viver e viver com qualidade e dignidade é o mínimo que poderíamos ter para viver bem. É o básico! Ninguém vive só o fim de semana, quando vai embora da cidade “servir de “paga a conta” e de chacota pra uns vizinhos da casa de praia e perturbar a paz de outros, que têm que se mudar de casa pra ter sossego!

Vamos viver todos os dias. Vamos investir em nós mesmos e na coletividade, vamos exigir educação e saúde de qualidade para nossos filhos, vamos enxergar nossas mazelas, tão simples de serem solucionadas, vamos lutar por nossos direitos e não bancar a festa pra quem só quer poder, às nossas custas, vamos pensar mais antes de votar, vamos ser mais cidadãos, nós podemos, somos fortes economicamente e culturalmente, vamos saber mais de nós mesmos. Vamos ser mais felizes e menos hipócritas!

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

TEATRO


Grande Arnaldo Vitorino!
Faço questão de começar com elogios. Faço questão de elogiar o que deve ser elogiado. Parafraseando "Louvação".
Quem não viu vá ver o acervo do orkut dele...
Iniciativas como essa devem ser sempre elogiadas, sua página no orkut é um dos únicos espaços que temos para saber de coisas da nossa verdadeira história. Nossa "casa de memória", um sonho há muito acalentado pelo IPHACC - Instituto Pernambucano de História, Arte, Cultura e Cidadania, e por tantos santacruzenses que pretendem que seus filhos saibam alguma coisa de suas raízes, continua sonho! Nossos acervos históricos estão se perdendo, e se perderão até que alguém que esteja no poder, que é pago pra isso mas não o faz, tenha a vontade e a responsabilidade de assumir esse compromisso com a posição que ocupa e consigo mesmo - pois compromisso com nosso povo já vimos que eles nunca tiveram - e crie esse espaço tão necessário ao desenvolvimento cultural de nosso povo.
Comecei assim, como essas garotas da foto, com a vontade de me expressar e de fazer ver às outras pessoas o meu pensamento, o pensamento do meu grupo, o pensamento de um momento histórico (ironias do destino, deveria ter cursado história, talvez fosse mais fácil nas salas de aula), sem nem mesmo saber que era arte, mas com uma vontade imensa de fazê-lo. Queríamos apenas fazer... Foi com elas que tive o primeiro contato com o que hoje chamo de teatro, contato apenas como espectador, mas que marca o início da paixão pela arte. O primeiro texto "sério" que interpretei foi "Hora de dormir" de Fernando Sabino, era um dos textos do meu livro de português da 7ª Série, que meu professor Suiteberto se atreveu a dirigir e nos convidou a mim e a Fernando Amaral para interpretar, antes disso fazíamos apenas pequenos esquetes, com textos improvisados, nas datas comemorativas do Colégio Cenecista. Me afastei do teatro até acabar a universidade, sabia apenas das lutas por um espaço para o teatro santacruzense, que passou por um terreno público no final da Av. Padre Zuzinha, onde hoje fica a residência do Dr. Nanau, depois foi para outro, na Av. Braz de Lira, onde hoje fica a Praça da Paz, depois para a Av. 29 de Dezembro, onde hoje é o Supermercado Tibúrcio e acabou "nos fundos do Ypiranga", como muitos se referenciam ao informar onde fica o nosso "teatro". Enfim tivemos construída uma casa de espetáculos!
No ano 2000 quando imaginávamos que o mundo iria "se acabar" ganhamos um teatro. Na ocasião, Márcio Nunes, diretor da Cia. di Projectus Cênicos, me falava da necessidade de um teatro mais voltado para nossa cultura, da necessidade de textos com temas e linguagem nordestina. Me atrevi a escrever pela primeira vez uma peça. Pesquisei bastante os temas tratados nos folhetos de cordel e sua linguagem, métrica, rimas, etc. Surgiu então "Uma estória de trancoso - O causo do cantadô de cordé, que por astúcia do cão, arresolveu dá conta de suas duas mulé". Márcio montou e fomos muito felizes na primeira temporada de um espetáculo santacruzense, num teatro santacruzense, com texto santacruzense. Foram cinco sextas e cinco sábados de casa, senão lotada e com pessoas sentadas no chão, como foi a estréia e o encerramento da temporada, com um bom público. Depois veio a 1ª Mostra de Teatro Experimental de Santa Cruz do Capibaribe, um sucesso de crítica e de público, quatro dias de casa lotada, com textos e espetáculos criativos e temática variada: Pil Queiroz com sua "Crucifixão" espetáculo magistral e autoral (texto, direção, cenografia, figurino, interpretação); Ronaldo Nerys com "Médeia - de Eurípides - acorrentada" e uma brilhante atuação de Rosilane Salazar; Márcio Nunes e Pil Queiroz com fragmentos de textos de Guimarães Rosa e João Cabral de Melo Neto criaram "A terceira Margem do Rio e Uma Outra Estória" uma leitura dramatizada com um cenário esplendoroso onde Márcio se utilizou das bacias das lavadeiras do Rio Capibaribe cheias d'água, criando efeitos de luz inusitados; A Cia. Mais Caras de Teatro, de Fortaleza com um espetáculo de Clowns maravilhoso "Nada, Nenhuma e Ninguém; Ricardo com sua "Santa Maria Egipcíaca" e eu com "Eu os ridículos e os gênios de uma poesia".
A Cia de Márcio e sua trupe ainda tá aí na ativa, depois disso produziram, "Joca, Befa e Zeca"; "A bruxinha que era boa"; "O show do Thed"um e dois; "O Macaco Malandro"; "Depois do Café"; "Caritó é a Madrinha"; "A eleição" e tantas outras que não lembro agora, mas, porém, contudo, todavia, sempre produções de bom nível técnico e artístico. Além desses espetáculos, capitaneados por Márcio Nunes, tantos como Avani Lopes, Bethânia Aragão, Pil Queiroz, Rosilane Salazar, Márcia Feitosa, Lourdes e Estela Aragão, Aninha Silva, Jeanne Chagas, Ana Nunes, Sandra, Jorge Feitosa, Diógenes e outros que seria impossível lembrar todos, vale destacar também dois espetáculos que fizeram muito sucesso na nossa dramaturgia que foram "Brincar de Viver" e "O rio, a santa e a feira".
Pois é, nosso teatro sempre foi muito rico, embora tenha sempre sido feito aos "trancos e barrancos", quando tem apoio, geralmente é da iniciativa privada, pelo menos é o apoio mais relevante.
Nosso poder público, assim como no país inteiro, destina pouquíssimos recursos para a cultura e mais do que apoio financeiro, o teatro precisa de apoio logístico, infra-estrutura de qualidade, tratamento diferenciado. A arte exige isso para acontecer a contento.
Vivemos hoje uma realidade mórbida na nossa cidade. O teatro municipal serve muito mais para outras finalidades do que a principal, que é o teatro, como o próprio nome do espaço sugere. Muitos argumentos são utilizados como justificativa, a pouca produção, que por falta de incentivos tende a sucumbir, é um deles.
Nosso teatro nunca teve um diretor, suas leis de funcionamento não beneficiam os artistas, o espaço passa a maior parte do tempo ocioso (fechado, mofando) a renda nunca foi revertida para o benefício do mesmo, o palco nunca teve qualidade técnica para receber bons espetáculos (iluminação, piso, cortinas, tapadeiras e rotunda, altura para elevação de cenários, etc), a pauta é muito obscura, no sentido de estar vazia e poder ser ocupada preferencialmente por espetáculos de teatro... Enfim, é difícil querer fazer arte em Santa Cruz do Capibaribe!
Se for enumerar todos os fatores que desestimulam a produção teatral na cidade, teria que passar por questões políticas e até pessoais e isso não constrói. Porém nosso povo tem a vontade, o que faz com que tenhamos esperanças num futuro, que não vislumbro tão próximo, mas que podemos lutar para que se aproxime.
Quero com esse pequeno artigo, começar uma discussão acerca do fazer arte em nossa cidade. Gostaria muito da opinião e da colaboração de todos para que o assunto possa ser enriquecido coletivamente. Não sou dono da verdade, não sei tudo e nem lembro tudo. Poste seu comentário!